Radar Fiscal

Por que o Brasil chegou ao menor índice de pobreza da história? Entenda os números e o que ainda falta

Por que o Brasil chegou ao menor índice de pobreza da história? Entenda os números e o que ainda falta

Compartilhe esse artigo:

WhatsApp
Facebook
Threads
X
Telegram
LinkedIn

Na última quarta‑feira (3), o IBGE divulgou a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) 2024 e trouxe uma notícia que parece um suspiro de alívio: o Brasil registrou os menores níveis de pobreza e de extrema pobreza desde que a série histórica começou, em 2012. Mas, como tudo que envolve números de macroeconomia, esses resultados merecem uma análise mais cuidadosa. Vamos entender o que mudou, quais fatores realmente impulsionaram a queda e onde ainda há muito trabalho a fazer.

Os números que chamam a atenção

  • Extrema pobreza: de 4,4 % em 2023 para 3,5 % em 2024 – queda de 0,9 ponto percentual, o que equivale a 1,9 milhão de pessoas a menos nessa condição.
  • Pobreza (pobreza monetária): de 27,3 % para 23,1 % – uma redução de 8,6 milhões de brasileiros.
  • Rendimento domiciliar per capita: R$ 2.017 mensais em 2024, o maior já registrado desde 2012 (R$ 1.697 em 2012).
  • Índice de Gini: 0,504 em 2024, o menor da série (de 0,517 em 2023).

Esses números, à primeira vista, dão a impressão de que o país está finalmente no caminho certo. Mas o que eles realmente significam para quem vive a realidade do dia a dia?

Como o IBGE mede a pobreza?

O estudo usa o conceito de pobreza monetária, que considera apenas a renda disponível da família. A linha de corte segue parâmetros do Banco Mundial, calculados pela Paridade do Poder de Compra (PPC):

  • Pobres: renda inferior a US$ 6,94 por pessoa ao mês.
  • Extremamente pobres: renda abaixo de US$ 2,18 por pessoa ao mês.

Importante notar que esse critério não leva em conta outros aspectos como qualidade da moradia, acesso à educação ou saúde. Portanto, mesmo com a queda da pobreza monetária, ainda há vulnerabilidades que não aparecem nos números.

O que realmente impulsionou a queda?

Segundo o pesquisador André Geraldo de Moraes Simões, do IBGE, duas forças principais se destacam:

  1. Mercado de trabalho aquecido: mais de 70 % da renda domiciliar per capita vem do trabalho. Quando há mais vagas e salários mais competitivos, a renda familiar sobe.
  2. Programas de transferência de renda: Bolsa Família, Auxílio Brasil e os auxílios emergenciais de 2020‑2021 tiveram papel crucial. Simões estima que, sem esses benefícios, a extrema pobreza subiria de 3,5 % para 10 % da população.

É interessante observar que, nos anos em que os auxílios foram reduzidos (2021), a taxa de pobreza voltou a subir, mostrando a sensibilidade da população mais vulnerável a políticas de apoio.

Quem ainda está mais vulnerável?

Mesmo com a melhora geral, alguns grupos permanecem em situação delicada:

  • Crianças e adolescentes (0‑14 anos): 39,7 % abaixo da linha de pobreza.
  • População negra: 29,8 % dos pardos e 25,8 % dos pretos em pobreza.
  • Mulheres: 24 % em situação de pobreza, acima da taxa masculina.
  • Idosos: 8,3 % – ainda a menor taxa, graças às aposentadorias e benefícios previdenciários.

Desigualdade regional: o caso do Nordeste

O Brasil tem dimensões continentais, e a distribuição da pobreza reflete isso. O Nordeste, que concentra apenas 26,9 % da população, abriga mais da metade das pessoas em extrema pobreza (50,3 %) e quase metade dos pobres (45,8 %).

Em 2024, a taxa de pobreza no Nordeste foi de 39,4 %, enquanto o Norte chegou a 35,9 %. No outro extremo, Sul e Centro‑Oeste registraram as menores taxas, com 1,5 % e 1,6 % de extrema pobreza, respectivamente.

Os “working poor”: quem tem emprego, mas ainda vive na pobreza

Um dado que costuma passar despercebido é o dos working poor: pessoas empregadas que ainda vivem em domicílios pobres. Em 2024, 11,9 % dos trabalhadores – cerca de 12 milhões de brasileiros – estavam nessa situação. Entre os ocupados, 0,6 % estavam em extrema pobreza (aprox. 585 mil pessoas).

O risco de pobreza aumenta drasticamente entre os desempregados: 47,6 % dos desocupados são pobres, contra 27,8 % das pessoas fora da força de trabalho.

Algumas ocupações se destacam:

  • Trabalhadores domésticos – 8,7 % dos trabalhadores pobres.
  • Agricultores e trabalhadores rurais qualificados – 6,6 %.
  • De modo geral, 10 ocupações concentram 41,7 % dos trabalhadores pobres.

O que isso significa para o seu bolso?

Se você está pensando em como esses números afetam a sua vida, vale observar alguns pontos práticos:

  • Mais oportunidades de emprego podem traduzir salários ligeiramente maiores, principalmente nos setores que mais cresceram nos últimos anos.
  • Benefícios sociais ainda são essenciais. Caso você receba algum auxílio, saiba que ele tem um peso direto na sua capacidade de consumo e, consequentemente, no bem‑estar da sua família.
  • Planejamento financeiro ganha um novo sentido. Mesmo que a renda média tenha subido, a diferença entre quem ganha bem e quem está na faixa da pobreza ainda é grande. Investir em qualificação pode ser a chave para sair da situação de “working poor”.

Desafios que permanecem

Apesar dos números positivos, a jornada está longe de terminar. Alguns desafios críticos incluem:

  1. Reduzir a desigualdade regional: políticas focadas no Nordeste e no Norte são imprescindíveis para equilibrar oportunidades.
  2. Combater a pobreza de gênero e racial: iniciativas que garantam igualdade salarial e acesso a educação de qualidade para mulheres e população negra.
  3. Fortalecer a proteção social: garantir que programas como o Bolsa Família evoluam para modelos mais sustentáveis, que não dependam apenas de crises pontuais.
  4. Melhorar a qualidade de vida: ir além da renda monetária, investindo em moradia digna, saúde e educação.

O que esperar para os próximos anos?

Se a tendência de aumento da renda per capita continuar, podemos esperar que a taxa de pobreza siga em queda. Contudo, isso depende de:

  • Manutenção de um mercado de trabalho dinâmico, com vagas em setores de alta produtividade.
  • Políticas públicas que não só criem empregos, mas também elevem a qualificação da força de trabalho.
  • Continuidade e aprimoramento dos programas de transferência de renda, adaptados à nova realidade pós‑pandemia.

Em resumo, os dados do IBGE são um sinal de que o Brasil está no caminho certo, mas ainda há muito a fazer para que a melhoria seja sentida por todos, especialmente pelos grupos mais vulneráveis.

Se você tem dúvidas sobre como esses números impactam sua vida ou quer saber quais políticas podem ajudar a melhorar ainda mais a situação, deixe seu comentário. A conversa sobre pobreza e desigualdade deve ser constante, e cada ponto de vista ajuda a construir soluções mais eficazes.