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Lula e Trump na linha direta: o que a cooperação contra o crime organizado pode mudar no Brasil

Lula e Trump na linha direta: o que a cooperação contra o crime organizado pode mudar no Brasil

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Na última terça‑feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex‑presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, conversaram ao telefone por cerca de 40 minutos. O assunto? Um trio de desafios que, segundo o ministro da Fazenda Fernando Haddad, são críticos para a segurança e a economia brasileira: lavagem de dinheiro, recuperação de patrimônio no exterior e o fluxo de armas ilegais que vem dos EUA.

Por que essa conversa ganhou tanta atenção?

Não é todo dia que vemos dois líderes tão diferentes – ideologicamente e em termos de estilo – alinhados em torno de um objetivo comum. Para o Brasil, isso significa abrir uma janela de cooperação que pode impactar diretamente o bolso do cidadão, a segurança nas comunidades e a competitividade das empresas nacionais.

1. Lavagem de dinheiro: o elo entre Brasil e Delaware

Haddad revelou que a Receita Federal identificou 15 fundos em Delaware, nos Estados Unidos, que funcionam como “caixas‑pretas” para recursos ilícitos. Esses fundos, por lei local, não precisam revelar quem são os beneficiários, o que os torna perfeitos para quem quer esconder a origem do dinheiro.

  • Como funciona? Grupos criminosos enviam recursos ao exterior, disfarçam como investimentos legítimos e, depois, trazem o dinheiro de volta ao Brasil, comprando empresas, imóveis ou até iates.
  • O que a Receita descobriu? Aproximadamente R$ 70 bilhões em movimentações suspeitas nos últimos 12 meses, com pelo menos R$ 1,2 bilhão já encaminhados ao exterior.
  • Qual o ganho da cooperação? A possibilidade de usar mecanismos americanos de rastreamento e bloqueio para congelar esses fundos e, eventualmente, devolver o dinheiro ao erário.

Para quem tem uma pequena empresa ou investe em imóveis, isso pode significar menos concorrência desleal. Quando o dinheiro sujo sai da competição, as empresas honestas ganham espaço.

2. Recuperação de patrimônio: mansões, iates e empresas nos EUA

Além dos fundos, o crime organizado mantém um “portfólio de luxo” nos Estados Unidos. São mansões em Florida, iates em Miami e participações em empresas de energia. Haddad afirmou que, com a ajuda do Departamento de Justiça americano, o Brasil pode iniciar processos de extradição de ativos.

Imagine que parte desses bens seja revertida para compensar os danos causados pelos esquemas de combustíveis adulterados – a chamada “máfia dos combustíveis” – que já gerou prejuízos bilionários ao consumidor.

3. Armas ilegais: o que vem nos contêineres?

O terceiro ponto da conversa abordou o fluxo de armas dos EUA para o Brasil. Segundo Haddad, fuzis e peças desmontadas chegam escondidos em contêineres que não passam por escaneamento nos portos americanos. Essa prática alimenta o crime nas comunidades, sobretudo nas áreas periféricas.

  • O pedido de Lula: que o mesmo rigor usado pelo Brasil para escanear contêineres em busca de drogas seja adotado nos portos americanos.
  • Impacto direto: menos armas nas mãos de quadrilhas, menos homicídios e mais sensação de segurança para a população.

O que isso significa para o cidadão comum?

Para quem lê notícias sobre política internacional e pensa que isso está distante da sua vida, a verdade é que essas questões têm reflexos muito próximos:

  1. Preços mais justos: ao desarticular a máfia dos combustíveis, o governo pode reduzir o preço dos combustíveis e, consequentemente, dos produtos que dependem deles.
  2. Mais empregos: com menos empresas “sujas” competindo de forma desleal, há mais espaço para negócios que pagam salários justos e contribuem com a arrecadação.
  3. Segurança nas ruas: menos armas ilegais significa menos violência, o que impacta diretamente a qualidade de vida nas cidades.

Tarifaço: o comércio também entrou na pauta

Além dos três eixos de segurança, Lula e Trump falaram sobre o chamado “tarifaço” – as barreiras tarifárias que os EUA impõem a produtos brasileiros, como carne, soja e calçados. Haddad garantiu que o governo brasileiro não vai descansar até que todas as empresas brasileiras estejam isentas dessas tarifas consideradas injustas.

Se a negociação avançar, os exportadores podem ganhar competitividade, o que pode gerar mais empregos nas cadeias produtivas e melhorar a balança comercial.

Como a cooperação pode ser colocada em prática?

O caminho não é simples, mas alguns passos já foram descritos:

  • Troca de informações entre Receita Federal e o Internal Revenue Service (IRS) dos EUA.
  • Envio de documentos ao Departamento de Justiça americano, já traduzidos, para iniciar processos de bloqueio de ativos.
  • Estabelecimento de protocolos de inspeção conjunta nos portos, para garantir que contêineres suspeitos sejam verificados em ambos os lados do Atlântico.
  • Criação de um grupo de trabalho binacional focado em crimes financeiros e tráfico de armas.

Essas medidas exigem vontade política, recursos e, sobretudo, confiança mútua – algo que, segundo Haddad, foi demonstrado na conversa entre Lula e Trump.

Desafios e críticas

Nem tudo são flores. Alguns analistas apontam que a cooperação com um governo que tem postura protecionista pode ser usada como moeda de troca em outras negociações, como as tarifas. Outros temem que o foco em crimes transnacionais desvie a atenção de problemas internos, como a violência nas favelas que não tem relação direta com armas dos EUA.

Além disso, a eficácia de processos de recuperação de patrimônio no exterior costuma ser lenta e burocrática. Mesmo que os ativos sejam identificados, o tempo para que eles voltem ao Brasil pode levar anos.

O que podemos esperar nos próximos meses?

Se tudo correr como o planejado, nos próximos seis a doze meses poderemos ver:

  • Bloqueio de alguns dos fundos de Delaware e início de processos de devolução de recursos.
  • Primeiros acordos de inspeção de contêineres entre autoridades brasileiras e americanas.
  • Negociações avançadas sobre a redução ou eliminação de tarifas sobre produtos estratégicos.

Esses passos, ainda que pequenos, podem gerar um efeito cascata: mais confiança dos investidores, redução da violência e, quem sabe, um alívio nos preços dos combustíveis.

Conclusão

Uma conversa de 40 minutos entre Lula e Trump pode parecer apenas mais um telefonema diplomático, mas, na prática, abre portas para ações concretas que afetam a vida de todos nós. Seja recuperando bilhões que estavam “escondidos” no exterior, seja dificultando a entrada de armas nas ruas ou pressionando por tarifas mais justas, a cooperação bilateral tem potencial para gerar mudanças reais.

Como cidadão, o melhor que podemos fazer é acompanhar esses desdobramentos, cobrar transparência e, principalmente, entender como essas políticas podem melhorar nossa segurança, nossos empregos e nosso poder de compra. Afinal, a política internacional não é um teatro distante – ela tem reflexos diretos no nosso dia a dia.