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Joesley Batista em Caracas: Quando o dono da JBS vira diplomata improvisado

Joesley Batista em Caracas: Quando o dono da JBS vira diplomata improvisado

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Quando você pensa em diplomacia, provavelmente imagina embaixadores, ministros das Relações Exteriores ou até mesmo presidentes viajando em missões oficiais. Mas, nos últimos dias, o nome que apareceu nos noticiários como “diplomata” foi o de um empresário que, até pouco tempo, era mais conhecido pelos churrascos corporativos da JBS: Joesley Batista.

O que aconteceu?

Em 23 de novembro, Joesley chegou a Caracas para encontrar o presidente venezuelano Nicolás Maduro. O objetivo? Pedir que Maduro deixasse o poder de forma pacífica. A reunião foi relatada pela Bloomberg, que destacou que a viagem foi iniciativa do próprio empresário, sem convite oficial dos Estados Unidos, embora a Casa Branca estivesse ciente da visita.

Por que um empresário brasileiro se mete na crise venezuelana?

A JBS, maior produtora mundial de proteína animal, tem laços comerciais antigos com a Venezuela. Em 2015, a empresa fechou um acordo de US$ 2,1 bilhões para fornecer carne ao país, que então enfrentava escassez de alimentos. Além disso, filiais do grupo J&F – como a Fluxus – vêm tentando abrir portas no setor energético venezuelano.

Esses interesses econômicos explicam, em parte, a motivação de Joesley: garantir que a instabilidade política não afete contratos já existentes e, quem sabe, abrir novas oportunidades de negócios em um mercado que, apesar das sanções, ainda tem muito petróleo e demanda por alimentos.

Um cenário de tensão entre Caracas e Washington

Para entender a importância da visita, vale lembrar que a relação entre os EUA e a Venezuela está no ponto mais crítico dos últimos anos. O governo de Donald Trump acusou Maduro de liderar o “Cartel de los Soles”, classificado como organização terrorista, e chegou a anunciar o fechamento total do espaço aéreo ao redor da Venezuela. A pressão incluiu o deslocamento de cerca de 15 mil militares americanos e o envio do porta-aviões USS Gerald Ford ao Caribe – o maior movimento desde a invasão do Panamá em 1989.

Maduro, por sua vez, nega as acusações e acusa os EUA de tentar tomar o controle do petróleo venezuelano. Nesse contexto, a presença de um empresário brasileiro, que não representa nenhum governo, mas tem influência econômica, pode ser vista como um esforço de mediação – ou, para os críticos, como um ato de legitimação do regime de Maduro.

Joesley e o governo brasileiro: qual é a conexão?

Embora o Palácio do Planalto não tenha se pronunciado oficialmente, a visita de Joesley não foi feita no vácuo. Em outubro, ele integrou a delegação empresarial que acompanhou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua viagem ao Sudeste Asiático, buscando alternativas diante da deterioração das relações com Washington. Além disso, Joesley já esteve na Casa Branca para discutir tarifas sobre exportações brasileiras, inclusive carne bovina.

Esses encontros mostram que, apesar de não ocupar cargo público, o empresário mantém interlocução com figuras de alto escalão nos EUA e no Brasil. Essa rede de contatos pode facilitar diálogos informais que, embora não sejam oficiais, influenciam decisões estratégicas.

O passado polêmico de Joesley

Não dá para falar de Joesley Batista sem lembrar dos escândalos que marcaram sua trajetória. Em 2017, ele gravou uma conversa com o então presidente Michel Temer, revelando subornos e gerando o chamado “Joesley Day”, que provocou uma das maiores quedas nas bolsas brasileiras. A delação premiada resultou em acordos com o Ministério Público Federal e em sua saída temporária da JBS.

Esses episódios deixaram uma mancha na imagem pública do empresário, mas também mostraram sua capacidade de operar nos bastidores da política, seja no Brasil ou, agora, em Caracas.

O que isso significa para nós, leitores?

  • Impacto nos preços da carne: Se a tensão entre Venezuela e EUA se intensificar, pode haver interrupções nas cadeias de suprimento que afetam a exportação de carne brasileira.
  • Relações Brasil‑EUA: A mediação informal de empresários como Joesley pode ser um sinal de que o governo brasileiro está buscando caminhos alternativos para reduzir a dependência das decisões americanas.
  • Investimentos em energia: A presença de empresas do grupo J&F no setor energético venezuelano indica que, apesar das sanções, há interesse em explorar oportunidades de energia que podem, no futuro, envolver parcerias com o Brasil.
  • Roraima e a energia: A tentativa da Âmbar Energia de importar eletricidade da Venezuela para abastecer Roraima, embora ainda não concretizada, mostra como projetos transfronteiriços podem ser afetados por questões diplomáticas.

Perspectivas futuras

O que esperar daqui para frente? É provável que Joesley continue atuando como um “diplomata” informal, buscando abrir canais de diálogo entre Caracas, Washington e Brasília. Se conseguir, pode ajudar a suavizar a crise e garantir que negócios da JBS e de outras empresas brasileiras não sejam prejudicados.

Por outro lado, a visita pode gerar críticas tanto no Brasil quanto no exterior, sobretudo de quem vê a presença de empresários privados em negociações de alta tensão como uma forma de legitimar regimes autoritários. O equilíbrio entre interesses econômicos e princípios democráticos será o grande desafio.

Conclusão

Joesley Batista, o “diplomata” inesperado, demonstra que o mundo dos negócios e da política está cada vez mais interligado. Sua viagem a Caracas, embora não oficial, coloca em evidência como grandes corporações podem influenciar – ou ao menos tentar influenciar – decisões geopolíticas. Para nós, consumidores e cidadãos, isso significa ficar atentos não só ao preço da carne no supermercado, mas também às manobras de poder que acontecem nos bastidores das mesas de negociação.

Se você acompanhou a história, provavelmente percebeu que a diplomacia não está mais restrita a corredores de embaixadas. Ela pode acontecer em aviões particulares, em salas de reunião de empresas e, quem diria, até em churrascos corporativos. E, no fim das contas, quem se beneficia ou perde com tudo isso? Todos nós.