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Lula pressiona França e Itália: o que o acordo UE‑Mercosul significa para o agro brasileiro

Lula pressiona França e Itália: o que o acordo UE‑Mercosul significa para o agro brasileiro

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Eu sempre fico curioso quando vejo uma negociação internacional que pode mudar a vida de quem trabalha no campo. Recentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um apelo direto ao presidente da França, Emmanuel Macron, e à primeira‑ministra da Itália, Giorgia Meloni, pedindo que eles assinem o tão esperado acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. A conversa aconteceu enquanto ele se preparava para uma reunião em Foz do Iguaçu, no Paraná, que pode ser o palco da assinatura oficial. Mas, afinal, por que esse tratado é tão importante para o agro brasileiro e o que está em jogo nas mesas de negociação?

## Por que o acordo UE‑Mercosul gera tanta expectativa?

– **Acesso a novos mercados**: O bloco europeu representa cerca de 450 milhões de consumidores. Se o acordo for ratificado, produtos como carne bovina, soja, café e açúcar podem entrar na UE com tarifas reduzidas ou zero.
– **Diversificação de exportações**: Atualmente, a China e os EUA são os maiores destinos das exportações agrícolas brasileiras. O tratado abre uma terceira rota, diminuindo a dependência de poucos parceiros.
– **Modernização do agronegócio**: Para cumprir as exigências sanitárias e ambientais da UE, produtores precisarão investir em tecnologia, rastreabilidade e práticas mais sustentáveis – um impulso que pode elevar a competitividade global do Brasil.

## O que está impedindo a assinatura?

A resposta não está só nas questões técnicas, mas também em questões políticas e de percepção. O Parlamento Europeu aprovou recentemente os chamados *mecanismos de salvaguarda*, que permitem suspender temporariamente os benefícios tarifários caso a UE perceba que o acordo prejudica seu próprio setor agro. Essa medida foi vista como um “ponto de partida” mais rígido do que a proposta original da Comissão Europeia, gerando dúvidas nos países membros.

### O papel da França e da Itália

– **França**: É o principal opositor dentro da UE. Agricultores franceses temem que a entrada de carne bovina e soja do Mercosul “inunde” o mercado interno, reduzindo preços e colocando em risco a produção local. Macron, segundo o presidente Lula, ainda está receoso de perder competitividade.
– **Itália**: Embora menos vocal que a França, a primeira‑ministra Meloni também compartilha a preocupação de que produtos europeus possam ser prejudicados. Ambos concordaram recentemente em adiar a votação, o que deixa o futuro do acordo em aberto.

## O que Lula realmente quer?

Lula deixou claro que não está pedindo um “acordo de amor”, mas sim responsabilidade. Ele disse ao presidente francês que o Brasil não compete diretamente com os produtos agrícolas da França – são “coisas diferentes, qualidades diferentes”. Em outras palavras, ele quer que a UE reconheça que o Brasil pode exportar produtos que complementam, e não substituem, os europeus.

## Como o acordo pode impactar o produtor rural brasileiro?

### Benefícios potenciais

1. **Preços mais estáveis**: Com acesso a um mercado maior, os produtores podem negociar melhores preços, reduzindo a volatilidade que costuma acompanhar as exportações para a China.
2. **Novas oportunidades de nicho**: A UE tem demanda crescente por produtos orgânicos, de origem certificada e com menor pegada de carbono. O acordo pode abrir portas para pequenos produtores que já trabalham nesses padrões.
3. **Incentivo à inovação**: Para atender às exigências europeias, fazendas precisarão adotar tecnologias como agricultura de precisão, monitoramento de emissões e certificações de bem‑estar animal.

### Riscos e desafios

– **Concorrência interna**: Se as salvaguardas forem acionadas, parte das tarifas pode ser suspensa, tornando os produtos europeus mais baratos no Brasil e pressionando os agricultores locais.
– **Dependência de políticas externas**: A assinatura ainda depende da aprovação do Conselho Europeu, que exige maioria qualificada (15 países representando 65 % da população da UE). Um único voto negativo pode atrasar tudo novamente.
– **Pressão social**: Movimentos ambientais e de consumidores na Europa estão cada vez mais críticos em relação ao desmatamento na Amazônia. Qualquer escândalo pode gerar boicotes e dificultar a implementação do acordo.

## O cenário político europeu

Além da França e da Itália, outros países têm posições distintas:

– **Polônia e Hungria**: Também se mostraram relutantes, temendo impactos ao setor agrícola interno.
– **Áustria e Irlanda**: Podem se opor, mas ainda não deixaram claro seu posicionamento.
– **Bélgica**: Anunciou que se absterá da votação, o que pode ser decisivo para alcançar a maioria qualificada.

Essas nuances mostram que o futuro do acordo não depende apenas de Macron e Meloni, mas de uma coalizão de interesses que precisam ser equilibrados.

## O que podemos fazer enquanto isso?

Se você é produtor, empresário do agronegócio ou simplesmente alguém que acompanha a pauta econômica, há algumas atitudes práticas:

– **Acompanhar as negociações**: Fique de olho nos comunicados do Ministério da Agricultura e nas notícias do Conselho Europeu. Cada mudança nas salvaguardas pode impactar sua estratégia de exportação.
– **Investir em certificações**: Mesmo antes da assinatura, buscar selos de sustentabilidade, rastreabilidade e bem‑estar animal pode colocar seu produto à frente da concorrência.
– **Diversificar mercados**: Não coloque todos os ovos em uma cesta. Continue cultivando relações com a China, os EUA e outros parceiros, enquanto aguarda a definição da UE.
– **Participar de associações**: Entidades como a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) ou a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) costumam oferecer informações e lobby junto aos governos.

## Olhando para o futuro

Se a assinatura acontecer em Foz do Iguaçu, no próximo sábado, será um marco histórico: um acordo negociado por quase três décadas finalmente concluído. Mas a assinatura não significa que tudo está resolvido. As salvaguardas, as revisões periódicas e a necessidade de adaptação às normas europeias garantirão que o tratado continue em debate por anos.

Para o agronegócio brasileiro, a mensagem é clara: **prepare-se agora**. O mercado europeu pode ser um prato cheio, mas só para quem chega com qualidade, transparência e capacidade de atender às exigências. E, como sempre, a política internacional será o pano de fundo que determinará se esses pratos serão servidos ou deixados na cozinha.

Então, enquanto o presidente Lula espera que Macron e Meloni “tragam a boa notícia”, nós aqui no Brasil podemos nos preparar para transformar essa oportunidade em crescimento real e sustentável. Afinal, a história do agronegócio sempre foi feita de desafios e de quem soube virar a página no momento certo.

*(Este texto tem cerca de 950 palavras.)