Na última sexta‑feira, a Dinamarca – que está à frente da presidência rotativa da União Europeia – confirmou que a votação sobre o tão aguardado acordo comercial com o Mercosul deve acontecer ainda na próxima semana. Para quem acompanha a política internacional, isso significa que, se tudo correr bem, a assinatura oficial pode acontecer ainda em dezembro, durante a visita da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ao Brasil.
Por que esse acordo importa tanto?
Não é exagero dizer que o tratado UE‑Mercosul pode ser o maior acordo de redução tarifária já firmado pela Europa. Depois de 25 anos de conversas, o bloco europeu e os quatro países sul‑americanos (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) chegaram a um entendimento que abre portas para exportações de alimentos, minerais e produtos industriais a preços muito mais competitivos.
Mas, como todo grande negócio, há quem veja oportunidades e quem veja riscos. A disputa principal gira em torno da agricultura europeia. Países como a França temem que a entrada maciça de carne bovina, aves e açúcar do Mercosul possa pressionar os preços internos e prejudicar os pequenos produtores.
Como funciona a votação?
Para que o acordo seja aprovado, a UE precisa de uma maioria qualificada: 15 dos 27 Estados‑membros, que representem ao menos 65 % da população da União. Isso significa que o apoio de países grandes – Alemanha, Espanha e os nórdicos – é crucial, mas a oposição de alguns membros pode bloquear tudo.
- Polônia: já declarou que votará contra.
- França e Itália: ainda indecisas, mas com tendência a exigir mais garantias.
- Alemanha, Espanha e países nórdicos: apoiam firmemente.
Se três desses países (Polônia, França e Itália) se juntarem a mais um que se abstenha ou vote contra, o acordo não passa.
O que mudou na proposta para acalmar os críticos?
A Comissão Europeia tentou suavizar a resistência adicionando um mecanismo de suspensão temporária de preferências tarifárias para alguns produtos agrícolas sensíveis, como carne bovina, aves e açúcar. Em teoria, se houver um impacto significativo nos produtores europeus, a UE poderia suspender esses benefícios por um período determinado.
Por que a Europa quer tanto esse acordo?
Além de abrir novos mercados para os produtores europeus, o tratado tem uma camada estratégica:
- Diversificação de fontes: a UE busca reduzir a dependência de fornecedores como China e EUA, especialmente em minerais críticos para a tecnologia (cobre, lítio, terras raras).
- Geopolítica: em um cenário de tensões comerciais globais, ter um bloco sul‑americano aliado pode fortalecer a posição da Europa nas negociações internacionais.
- Estímulo ao crescimento: a redução de tarifas pode gerar mais exportações, impulsionando a economia de países que ainda se recuperam da pandemia.
O que isso significa para nós, brasileiros?
Se o acordo for aprovado, o Brasil pode ganhar acesso preferencial a um dos maiores blocos consumidores do mundo. Isso pode se traduzir em:
- Maior competitividade das carnes brasileiras na Europa, que já são reconhecidas pela qualidade.
- Exportação ampliada de soja, milho e outros grãos, com tarifas reduzidas.
- Oportunidades para setores de mineração, especialmente para cobre e lítio, que são essenciais para a transição verde.
Mas há um lado menos glamouroso: produtores locais podem enfrentar concorrência mais acirrada, e a necessidade de adaptar padrões sanitários e ambientais pode gerar custos adicionais.
Os riscos de um “não”
Se a votação falhar, o acordo pode ficar “morto”, como alertou um diplomata da UE. As consequências seriam:
- Perda de um grande impulso econômico para ambos os blocos.
- Possível enfraquecimento da influência da UE em negociações globais, já que perderia um aliado estratégico na América do Sul.
- Continuação das barreiras tarifárias atuais, que ainda limitam o potencial de exportação do Mercosul.
Como acompanhar a situação
Para quem gosta de estar por dentro das decisões que afetam o comércio mundial, vale ficar de olho nas próximas notícias:
- Data da votação na UE (provavelmente início da próxima semana).
- Posicionamento final da França e da Itália – dois pivôs decisivos.
- Qualquer comunicado oficial de Ursula von der Leyen sobre a viagem ao Brasil.
- Reações dos setores agropecuários europeus e sul‑americanos após a decisão.
Meu ponto de vista
Eu vejo esse acordo como uma oportunidade rara de conectar dois continentes que, apesar de distantes, têm muito a ganhar um com o outro. Claro, a preocupação dos agricultores europeus é legítima – ninguém quer ver suas fazendas sofrerem com a concorrência desleal. Mas o mecanismo de suspensão pode ser uma ferramenta útil, desde que seja usado com transparência e critérios claros.
Para o Brasil, a chance de abrir as portas da Europa para nossos produtos agrícolas e minerais pode gerar empregos, renda e impulsionar a tecnologia local. O desafio será garantir que a expansão das exportações não venha às custas de práticas sustentáveis e de respeito aos direitos dos trabalhadores.
Em resumo, a votação da próxima semana pode ser um divisor de águas. Se o acordo for aprovado, estaremos testemunhando o nascimento de um novo eixo comercial que pode redefinir as relações econômicas entre o Velho e o Novo Mundo. Se não, a mensagem será clara: ainda há muito a ser negociado, e talvez seja preciso repensar estratégias para atender às preocupações de todos os envolvidos.
Fique atento, porque o que acontece nos corredores de Bruxelas pode mudar o que chega à sua mesa nos próximos anos.




