Quando a gente ouve falar de guerra comercial entre Estados Unidos e China, costuma imaginar fábricas, tecnologia e disputas de tarifas. Mas, na prática, o que acontece nas negociações internacionais acaba refletindo direto no campo brasileiro, e, principalmente, no nosso prato. Nos últimos meses o Brasil quebrou recordes de exportação de soja e amendoim para a China. Parece um número impressionante, né? Mas vamos entender por que isso importa para quem vive aqui, para quem planta, para quem compra e até para quem só quer economizar na feira.
Os números que surpreenderam o mercado
De janeiro a novembro de 2025, o Brasil enviou 80,9 milhões de toneladas de soja para a China. O recorde anterior era 75,5 milhões, registrado em 2023. Já o amendoim bateu um salto ainda mais drástico: 63 mil toneladas foram enviadas, o que representa um crescimento de mais de 2.600 % comparado ao total dos dois últimos anos somados.
Além disso, a exportação de óleo bruto de amendoim subiu 170 %, com 90 % da demanda vindo da China. Ou seja, não é só grão, mas também o produto derivado que está em alta.
Por que a China está comprando tanto agora?
O ponto de partida é a guerra comercial entre EUA e China. Quando Washington impôs tarifas sobre produtos chineses, Pequim precisou buscar alternativas para suprir a sua demanda interna. A soja americana, por exemplo, viu sua exportação para a China cair cerca de 90 %.
Com isso, a China virou os olhos para quem tem capacidade de produzir em escala – e o Brasil tem. A soja já é há duas décadas o maior importador chinês, mas agora o amendoim, antes dominado pelos EUA (cerca de 300 mil toneladas por ano), entrou no radar chinês para produção de óleo e ração animal.
O que isso muda no campo brasileiro?
- Preços mais altos: a alta demanda eleva o preço interno da soja e do amendoim, beneficiando agricultores e cooperativas.
- Planejamento de safra: produtores de regiões como Rio Verde (GO) já começam a ajustar o plantio, considerando a demanda chinesa como um dos principais indicadores.
- Investimento em tecnologia: com a perspectiva de exportar mais, faz sentido investir em sementes melhoradas, irrigação e manejo de pragas.
- Risco de concentração: depender muito de um único comprador pode ser perigoso se a política chinesa mudar novamente.
Mas nem tudo são flores – os desafios
É fácil ficar empolgado com números recordes, mas há alguns pontos críticos que vale a gente ficar de olho:
- Tarifas e barreiras não‑tarifárias: embora a China esteja comprando mais, ela ainda pode impor requisitos fitossanitários ou de qualidade que aumentem os custos de exportação.
- Logística: o porto de Santos, por exemplo, já enfrenta congestionamento. A capacidade de transportar milhões de toneladas até o litoral ainda é um gargalo.
- Volatilidade cambial: o real forte ou fraco pode mudar a competitividade dos nossos produtos no mercado internacional.
- Impacto ambiental: expansão de áreas de plantio pode pressionar biomas como o Cerrado e a Amazônia, exigindo políticas de sustentabilidade mais rígidas.
O que vem por aí? Sorgo na lista
Olha só: a partir de 2026 está prevista a primeira exportação de sorgo brasileiro para a China. Esse cereal tem uso diversificado – ração animal, produção de cerveja e até alimentos humanos. O interesse chinês surge porque a compra de sorgo dos EUA também caiu, seguindo a mesma lógica da soja.
Se tudo acontecer como o esperado, a China pode representar mais de 80 % das exportações brasileiras de sorgo, assim como acontece hoje com a soja.
Como o consumidor sente esse movimento?
Para quem faz compras no supermercado, a mudança pode ser percebida de duas formas:
- Preços: em um cenário de alta demanda externa, o preço interno pode subir. Mas, ao mesmo tempo, a maior escala de produção pode gerar economias de escala que, a longo prazo, estabilizam os valores.
- Qualidade: a pressão para atender padrões internacionais pode melhorar a qualidade dos grãos, beneficiando a cadeia de alimentos.
O que eu, como leitor, posso fazer?
Não é preciso ser agricultor para se envolver. Você pode:
- Preferir alimentos produzidos localmente, apoiando os pequenos produtores que ainda não têm acesso ao mercado internacional.
- Ficar atento às notícias de comércio exterior – elas afetam a inflação, o preço dos alimentos e até o valor do real.
- Investir, se houver interesse, em fundos ligados ao agronegócio, que tendem a se valorizar quando as exportações crescem.
Conclusão
O recorde de exportação de soja e amendoim para a China é mais que um número de 80 milhões de toneladas. É um termômetro que indica como a geopolítica, a tecnologia agrícola e as escolhas de consumo se entrelaçam. Para o Brasil, representa oportunidade de renda e desenvolvimento, mas também traz a responsabilidade de gerir recursos de forma sustentável e diversificar mercados.
Se você acompanha o mercado ou simplesmente quer entender por que o preço da soja na sua feira pode mudar, fique de olho nas próximas negociações entre Washington e Pequim. Afinal, o que acontece nos corredores das grandes potências acaba chegando ao prato da gente.




