Quando ouvi pela primeira vez que a Petrobras e a Shell haviam arrematado duas áreas do pré‑sal por quase R$ 9 bilhões, confesso que meu primeiro pensamento foi: “Mais uma negociação de gigantes, mas o que isso traz para a gente, cidadão comum?”. A resposta não é tão simples, mas vale a pena destrinchar o que aconteceu, por que o governo recebeu menos do que esperava e, principalmente, como isso pode impactar a economia, os preços dos combustíveis e até o futuro da energia no país.
O que foi leiloado?
Em um leilão inédito, a União colocou à venda participações em três blocos do pré‑sal já em produção: Mero, Atapu e Tupi. As duas primeiras foram compradas por um consórcio formado pela Petrobras e a Shell. No caso de Mero, a participação de 3,5 % da União foi vendida por R$ 7,79 bilhões; já em Atapu, 0,95 % foram negociados por cerca de R$ 1 bilhão. A terceira área, Tupi, não recebeu nenhum lance.
Por que o governo arrecadou menos?
A expectativa inicial, divulgada em novembro, era de R$ 10,2 bilhões só com Mero e Atapu, e a meta total do leilão girava em torno de R$ 15 bilhões, considerando ainda a venda da fatia de Tupi. O resultado final ficou em R$ 8,8 bilhões, cerca de R$ 1,4 bilhão abaixo da projeção.
- Queda do preço do Brent: o dirigente da PPSA, Luis Fernando Paroli, apontou que a queda do preço do barril de petróleo internacional diminuiu o apetite ao risco das empresas.
- Estrutura do leilão: a escolha por pagamento à vista, com parcelas contingentes (os chamados “earn‑outs”), fez com que a União revisasse a estimativa de arrecadação.
- Falta de concorrência: o leilão acabou sem concorrência efetiva – apenas a Petrobras e a Shell participaram, o que naturalmente reduz o valor final.
E o que é esse tal de “earn‑out”?
Além dos valores pagos à vista, o contrato prevê pagamentos adicionais caso certas condições sejam atendidas. Por exemplo, se a média anual do preço do Brent ultrapassar US$ 55 por barril, as empresas terão que desembolsar um extra à União. Também podem haver pagamentos se houver redeterminação das participações nas jazidas, aumentando o percentual das áreas não contratadas.
Como isso afeta o bolso do brasileiro?
É fácil pensar que um leilão de bilhões não tem relação direta com o preço da gasolina ou do diesel. Mas a cadeia é mais curta do que parece:
- Quanto maior a arrecadação do governo, mais recursos ele tem para investir em infraestrutura, saúde ou para reduzir a dívida pública.
- Se as empresas pagam menos agora, o Tesouro pode compensar a diferença com o que chamamos de “empoçamento de recursos” – dinheiro que foi autorizado no orçamento, mas ainda não foi gasto. Esse recurso costuma ser usado para cumprir metas fiscais no fim do ano.
- Os “earn‑outs” futuros podem gerar receitas adicionais, mas só se o preço do petróleo internacional subir – algo que ainda não podemos garantir.
Em resumo, no curto prazo o impacto no preço dos combustíveis será mínimo. No médio e longo prazo, tudo depende de como o governo utilizará esses recursos e de como o mercado de petróleo evoluirá.
Por que a Petrobras aumentou sua participação?
Em comunicado, a estatal informou que desembolsará R$ 6,97 bilhões neste mês para ampliar sua participação nos campos de Mero (de 38,60 % para 41,40 %) e Atapu (de 65,687 % para 66,38 %). Essa estratégia tem dois objetivos claros:
- Garantir maior controle de produção: quanto maior a fatia, mais petróleo a Petrobras pode vender diretamente.
- Fortalecer a posição no pré‑sal: o pré‑sal é a principal fonte de crescimento da produção nacional nos próximos anos, então ter mais participação é visto como um investimento de longo prazo.
O que falta no leilão de Tupi?
A área de Tupi, que teria sido vendida por um mínimo de R$ 1,69 bilhão, ficou sem lances. Paroli sugeriu que a visão dos compradores foi “um pouco pior” do que a expectativa, citando a queda do preço do Brent. Sete empresas se credenciaram, mas nenhuma chegou a fazer oferta.
Isso não significa que o governo perdeu dinheiro. A União continua recebendo e comercializando o óleo referente à sua participação em Tupi, que é um dos maiores campos do país. Portanto, a falta de lances agora não impede que o governo continue a lucrar com a produção.
Perspectivas para o futuro do pré‑sal
O pré‑sal tem sido o carro-chefe da política energética brasileira nos últimos anos. As reservas são enormes, e a tecnologia de exploração em águas ultra‑profundas tem avançado rapidamente. Porém, alguns desafios permanecem:
- Volatilidade dos preços internacionais: como vimos, a queda do Brent pode desestimular investimentos.
- Questões ambientais e de licenciamento: a pressão de ONGs e de comunidades costeiras pode atrasar projetos.
- Transição energética: com o mundo caminhando para fontes renováveis, o pré‑sal precisa se adaptar para ser parte de um mix energético mais diversificado.
Se a Petrobras e a Shell conseguirem extrair mais óleo de forma eficiente e sustentável, o Brasil pode contar com um fluxo de receitas estável por décadas. Por outro lado, se os preços permanecerem baixos, as empresas podem reduzir investimentos, afetando empregos e a arrecadação.
Conclusão: o que devemos ficar de olho?
Para quem acompanha a economia, os pontos-chave são:
- Preço do Brent: ele ainda dita o ritmo dos “earn‑outs” e da vontade de investir.
- Uso dos recursos arrecadados: se o governo aplicar bem o dinheiro, podemos ver melhorias em infraestrutura ou redução de impostos.
- Política de participação da Petrobras: aumentos de participação podem significar mais controle estatal sobre a produção.
Eu, pessoalmente, fico esperançoso ao ver que o país continua explorando suas riquezas de forma estratégica, mas também cauteloso diante da volatilidade do mercado global. Afinal, o petróleo ainda é o motor da nossa economia, mas o futuro pode exigir que ele compartilhe o palco com energia limpa.
Se você tem dúvidas sobre como esses números podem influenciar seu salário, o preço da bomba ou até mesmo a política fiscal, deixe seu comentário. Vamos conversar e descomplicar juntos esse universo de bilhões que, no fim das contas, afeta a vida de todos nós.




