Imagine a gente sentado num café, trocando ideias sobre o que está acontecendo na economia do país. Você já ouviu falar que o Brasil entrou em ‘pleno emprego’? Ou que o PIB cresceu apenas 0,1 % no último trimestre? Pode parecer ruim à primeira vista, mas, acredite, tem gente que vê isso como sinal de que o barco está finalmente encontrando um rumo mais seguro.
O que realmente aconteceu com o PIB no terceiro trimestre?
Os números divulgados pelo IBGE na última quinta‑feira (4/12) mostraram que o Produto Interno Bruto avançou 0,1 % em relação ao trimestre anterior. Quando comparamos com o mesmo período de 2024, o crescimento foi de 1,8 %, impulsionado principalmente pela agropecuária (+10,1 %), indústria (+1,7 %) e serviços (+1,3 %). No acumulado de 2025, o PIB já soma 2,4 % a mais que em 2024.
Esses números revelam que a maior parte do ritmo de crescimento aconteceu no primeiro semestre. Agora, no segundo semestre, a economia parece estar entrando em um ritmo mais lento, quase como se estivesse “freando” suavemente.
Por que a desaceleração pode ser boa?
Para entender o ponto de vista dos economistas, precisamos lembrar de dois conceitos que costumam aparecer nas conversas sobre política econômica: inflação e taxa de juros. Quando a economia cresce muito rápido, a demanda por bens e serviços aumenta mais rápido que a oferta. Isso gera pressão sobre os preços – a famosa inflação.
Nos últimos anos, o Brasil tem lidado com uma inflação acima da meta (4,5 %). O Banco Central, para conter esse avanço, elevou a taxa Selic a patamares historicamente altos. Essa “dose cavalar” de juros altos tem o objetivo de esfriar a demanda, reduzir a pressão inflacionária e, ao mesmo tempo, manter a confiança dos investidores.
Agora, com o PIB quase estável, o freio parece estar funcionando. A desaceleração indica que a política monetária está tendo efeito, sem provocar uma recessão profunda.
Pleno emprego: o que significa na prática?
Durante a pandemia, a taxa de desemprego chegou a 14 %. Hoje, ela está em 5,4 %, um número que muitos chamam de “pleno emprego”. Em termos simples, quase todo mundo que quer trabalhar consegue um emprego. Isso traz benefícios imediatos: mais renda nas famílias, aumento do consumo e, consequentemente, mais arrecadação de impostos.
Mas há um lado menos óbvio. Quando o mercado de trabalho está tão apertado, as empresas começam a disputar intensamente por trabalhadores. Essa competição eleva os salários, o que, por sua vez, eleva os custos de produção. Se a produtividade não acompanha esse aumento de custos, os preços dos produtos sobem, gerando inflação.
Portanto, o pleno emprego pode ser um “corte de faca”: traz bem‑estar no curto prazo, mas, se não houver ganho de produtividade, pode gerar pressões inflacionárias que corroem o poder de compra das famílias.
O papel duplo do Banco Central e do Governo
O cenário atual tem duas forças puxando a economia em direções opostas:
- Banco Central: controla a taxa de juros. Juros altos desaceleram o crédito, reduzem o consumo e, portanto, ajudam a conter a inflação.
- Governo Federal: por meio de políticas fiscais, como gastos públicos, programas sociais (Bolsa Família, por exemplo) e ajustes no salário‑mínimo, estimula a demanda.
Desde 2024, o Banco Central tem aumentado a Selic três vezes, atingindo níveis que nenhum outro país tem visto nos últimos anos. Enquanto isso, o governo aprovou a PEC da Transição, liberando cerca de R$ 200 bi em gastos adicionais, principalmente em transferências sociais.
Essa “briga” entre acelerar e frear cria um ambiente de incerteza. Se o governo continua a injetar recursos na economia enquanto o Banco Central tenta conter a inflação, o risco é que a política monetária perca força e a inflação volte a subir.
O que os especialistas estão dizendo?
Alguns nomes que apareceram nas entrevistas da BBC News Brasil – Mansueto Almeida (BTG Pactual), Rafaela Vitória (Banco Inter) e Silvia Matos (FGV) – trazem perspectivas complementares:
- Mansueto Almeida defende que um crescimento sustentável de 2 % a 2,5 % ao ano, com juros baixos, seria o cenário ideal. Ele compara a situação atual a dirigir um carro: o governo pisa no acelerador, o Banco Central no freio.
- Rafaela Vitória destaca que o pleno emprego é “excelente notícia”, mas alerta que o aumento de salários sem ganho de produtividade pode gerar inflação. Ela também aponta que a política fiscal expansiva ajudou a reduzir a pobreza – 8,6 milhões de brasileiros saíram da linha de pobreza entre 2023 e 2024.
- Silvia Matos enfatiza que a alta dos juros é histórica e que a desaceleração observada no PIB mostra que a política está surtindo efeito, embora ainda demore a alcançar o ritmo desejado.
Essas opiniões convergem para um ponto: a desaceleração não é sinônimo de crise, mas sim de um ajuste necessário para evitar que a economia “queime” por causa da inflação.
Quais são os riscos de uma desaceleração muito brusca?
Se a taxa de juros permanecer alta por muito tempo, há risco de que o crédito fique tão caro que empresas e consumidores deixem de investir e consumir. Isso poderia levar a uma recessão, como a que o Brasil viveu em 2015‑2016, quando o desemprego disparou e o PIB contraiu.
Por outro lado, se o Banco Central cortar juros antes que a inflação esteja sob controle, o país pode voltar a enfrentar pressões inflacionárias, desvalorizando a moeda e gerando instabilidade nos mercados.
A arte da política econômica está em encontrar o “pouso suave”: uma desaceleração gradual que permita a queda dos juros sem provocar uma queda abrupta na atividade.
O que podemos esperar para 2026 e além?
Os economistas entrevistados acreditam que, se tudo seguir o plano, o Brasil poderá entrar em 2026 com juros mais baixos, o que abrirá espaço para investimentos em infraestrutura, tecnologia e educação. Isso, por sua vez, aumentaria a produtividade e ajudaria a sustentar um crescimento de 2 % a 2,5 % ao ano.
Além disso, há expectativa de novos benefícios fiscais – como faixas de isenção do Imposto de Renda – que podem impulsionar o consumo no curto prazo, mas que precisarão ser equilibrados com ajustes fiscais nos anos seguintes, especialmente após as eleições de 2026.
Em 2027, a discussão provavelmente girará em torno de como manter o equilíbrio fiscal sem sacrificar o crescimento. O desafio será encontrar receitas suficientes para pagar a dívida pública, que ainda consome uma parte significativa do orçamento, ao mesmo tempo em que se garante proteção social.
Como isso afeta o seu dia a dia?
Você pode estar se perguntando: “E eu, que não sou economista, como isso me impacta?”. Aqui vão alguns pontos práticos:
- Juros de empréstimos: Se o Banco Central começar a reduzir a Selic, os juros de financiamento de carro, casa e até de cartão de crédito tendem a cair. Isso pode facilitar a compra de bens duráveis.
- Inflação: Uma inflação controlada significa que o preço dos alimentos, combustíveis e serviços não vai subir tão rápido, preservando seu poder de compra.
- Emprego: O pleno emprego indica que as oportunidades de trabalho continuam boas, mas é importante ficar atento a setores que podem sofrer com a automação ou com a alta de custos.
- Investimentos: Taxas de juros mais baixas tornam investimentos em renda fixa menos atraentes, mas abrem espaço para opções de renda variável, como ações e fundos imobiliários, que podem oferecer retornos maiores.
Em resumo, a desaceleração do PIB, quando bem conduzida, pode trazer um ambiente mais estável, com menos surpresas nos preços e mais oportunidades de investimento.
Conclusão: um copo meio cheio ou meio vazio?
Eu costumo olhar para esses números como quem observa o céu ao entardecer. À primeira vista, o fato de o crescimento ter sido tão pequeno pode parecer nublado, mas se você prestar atenção nas nuvens que se afastam, percebe que o sol está se aproximando.
Os economistas que acompanhei têm um otimismo cauteloso. Eles acreditam que, com a combinação certa de política monetária (juros mais baixos) e fiscal (gastos controlados), o Brasil pode evitar a temida recessão e ainda avançar rumo a um crescimento mais sólido e sustentável.
Para nós, que vivemos o dia a dia com contas para pagar, a notícia de que a inflação está começando a cair e que os juros podem baixar nos próximos anos é, sim, uma boa notícia. Mas, como tudo na vida, exige atenção, planejamento e, claro, um pouco de paciência.
Se você ainda tem dúvidas ou quer saber como ajustar seu orçamento ou investimentos diante desse cenário, estou aqui para conversar. Afinal, entender a economia não precisa ser um bicho de sete cabeças – basta um papo de café e um olhar atento aos indicadores que realmente importam.




